14 de fevereiro de 2009

Literatura Angolana


Se há algo de positivo a retirar por parte dos povos africanos de alguns séculos de colonização, será certamente a língua herdada dos povos colonizadores. Esta acaba por contribuir para uma determinada unidade quer cultural quer nacional, unidade essa de países formados, digamos mesmo a régua e esquadro, por ditames europeus e motivada superiormente por interesses económicos, não tendo em conta, bem entendido, as realidades sociais, geográficas, tribais e muitas outras. Assim se explica uma afirmação de um grande escritor angolano, e um escritor conceituado da lusofonia, ainda que, bem entendido, com um peso irónico. Dizia ele: “A língua portuguesa é o nosso espólio de guerra”.

E é através da assimilação, processo que durou séculos, lembremo-nos que a época colonial se estendeu do século XVI ao XX, que se foi criando o que agora se chama literaturas africanas de expressão europeia.

A literatura tradicional era passada por via oral. As crenças, cultura, histórias eram por esse processo que se transmitiam.

Se bem que os primeiros textos já com contornos literários remontam, no caso de Angola, ao século XVII, da autoria de António Dias Macedo, é já na primeira metade do século XIX que é editado (em 1849) o primeiro livro de poemas de um escritor angolano, José da Silva Maia Ferreira, um mestiço de Benguela. Embora alguns críticos digam que esta obra não tem ainda a sensibilidade angolana devido à assimilação cultural europeia.

É na segunda metade do século XIX, que aparece uma elite angolana, uma pequena burguesia bastante culta, e se criam os primeiros jornais.

Segundo Henrique Guerra, escritor, ensaísta e investigador angolano, a publicação do Boletim Oficial, em 1845, reveste-se de importância no aparecimento do jornalismo e da literatura e criando condições para o seu desenvolvimento. Destaca-se, nesta época, Alfredo Trony, um bacharel em direito natural de Coimbra, autor do romance “Nga Muturi”. Aparecem também jornais africanos, onde jornalistas angolanos denunciam a política de opressão de que Angola é vítima. Lutam por escolas, pela dignidade e pelo respeito pela educação, liberdade de associação e pela fundação de centros de cultura africanos, destacando-se, entre outros, os escritores Cordeiro da Matta e Pedro Félix Machado. Aquele defende a necessidade de Angola ter uma literatura própria.

Reportando-nos novamente a Henrique Guerra “à medida que a sociedade colonial se estrutura, portanto, aquela “pequena burguesia” vai definhando, ao mesmo tempo que se aniquilam as estruturas e as culturas nacionais angolanas”.

“Curioso também é reparar que à medida que os seus jornais vão sendo fechados pela repressão colonial, o movimento intelectual africano se vai organizando em associações culturais, adaptando-se às circunstâncias, para depois ressurgir na época dos anos 30-40”.

Entre 1900 e pouco depois de 1910 aparece-nos a geração de “Luz e Crença” e de “Uma voz de Angola clamando no deserto”. Este último é uma obra colectiva, publicada sob anonimato, “por razões que a repressão então justificava”, datada de 1901. É a intervenção de onze intelectuais angolanos contra um artigo publicado no então único jornal existente, a “Gazeta de Loanda”. Um artigo intitulado “contra a Lei, pela Grey” em que se defendia a subalternidade do homem negro em relação ao branco, negando ao negro o direito de fazer parte da humanidade. Este livro contém já os antecedentes nacionalistas que iriam levar à luta armada pela independência.

Desde então e até 1940 assistimos a um período de “ quase não-literatura”, no entender de Henrique Guerra. Aparece-nos António de Assis júnior, o grande representante desta época, que nos deixou “O segredo da morta” (romance de costumes angolenses) e “O relato dos Acontecimentos de Dala Tando”. Sobre Assis Júnior diz Manuel Ferreira “muito longe do apuramento literário de Alfredo Trony ou Pedro Félix Machado, cuida pelo menos de abandonar a visão colonialista, furtando-se à influência poderosa do romance colonial da época, e procede à construção de personagens e ambientes movimentados nas estruturas sociais e económicas de Angola”. Assis júnior nasceu em 1877 e morreu em Lisboa (no exílio) em 1960.

Na década de 40 do século XX a literatura angolana ressurge, através de jornais como “O Farolim” e o escritor Castro Soromenho.

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A literatura tradicional africana, oral, já foi alvo de recolhas. Segundo Henrique Guerra, um dos que se dedicou a essa investigação, “a literatura tradicional pode ser aproveitada para a criação de uma literatura infantil angolense”. “… eis um elemento que a torna aproveitável para literatura infantil, o de ensinar e educar recreando, o de moldar espíritos através da actividade lúdica, e ainda outro aspecto, a superação do real através do mítico, num jogo que a criança entende e aceita”.

Guerra considera mesmo que a “reinvenção da tradição literária dos povos africanos de Angola – ORATURA – é sem dúvida um dos vectores de desenvolvimento da moderna literatura angolense, em busca constante de uma identificação e personalidade cultural”.

Henrique Guerra nasceu em Luanda em 1937, é engenheiro civil e foi professor na Faculdade de Engenharia da Universidade Agostinho Neto. Pertence à geração da “Cultura”, assim conhecida devido àquela publicação literária dos anos 50/60 e colaborou com a “Mensagem”, da Casa dos Estudantes do Império, dois momentos importantes na evolução e afirmação da literatura angolana. Algumas das suas obras: “Trés histórias populares” (ficção narrativa, 1960); “A cubata solitária” (contos, 1962); “Quando me acontece poesia (poesia, 1976); “O círculo de giz de Bombó” 8teatro, 1979), ou “Angola – Estrutura económica e classes sociais” (ensaio, 1975).

As histórias da oralidade, passadas à escrita por, por exemplo e além de Henrique Guerra, Óscar Ribas, padre Carlos Estermann ou Héli Chatelain, são muitas vezes oriundas de contos portugueses reformulados e africanizados. Das histórias antigas, originárias de África, podem-se encontrar, Guerra encontrou, várias versões em locais diferentes. Muitas histórias podem ser ainda reminiscências do tempo da escravatura.

É um trabalho meritório este de recuperar histórias da tradição oral, mas, infelizmente, e ainda segundo o investigador angolano que temos vindo a citar, muitas ter-se-ão perdido. Se há algo de positivo a retirar por parte dos povos africanos de alguns séculos de colonização, será certamente a língua herdada dos povos colonizadores. Esta acaba por contribuir para uma determinada unidade quer cultural quer nacional, unidade essa de países formados, digamos mesmo a régua e esquadro, por ditames europeus e motivada superiormente por interesses económicos, não tendo em conta, bem entendido, as realidades sociais, geográficas, tribais e muitas outras. Assim se explica uma afirmação de um grande escritor angolano, e um escritor conceituado da lusofonia, ainda que, bem entendido, com um peso irónico. Dizia ele: “A língua portuguesa é o nosso espólio de guerra”.

E é através da assimilação, processo que durou séculos, lembremo-nos que a época colonial se estendeu do século XVI ao XX, que se foi criando o que agora se chama literaturas africanas de expressão europeia.

A literatura tradicional era passada por via oral. As crenças, cultura, histórias eram por esse processo que se transmitiam.

Se bem que os primeiros textos já com contornos literários remontam, no caso de Angola, ao século XVII, da autoria de António Dias Macedo, é já na primeira metade do século XIX que é editado (em 1849) o primeiro livro de poemas de um escritor angolano, José da Silva Maia Ferreira, um mestiço de Benguela. Embora alguns críticos digam que esta obra não tem ainda a sensibilidade angolana devido à assimilação cultural europeia.

É na segunda metade do século XIX, que aparece uma elite angolana, uma pequena burguesia bastante culta, e se criam os primeiros jornais.

Segundo Henrique Guerra, escritor, ensaísta e investigador angolano, a publicação do Boletim Oficial, em 1845, reveste-se de importância no aparecimento do jornalismo e da literatura e criando condições para o seu desenvolvimento. Destaca-se, nesta época, Alfredo Trony, um bacharel em direito natural de Coimbra, autor do romance “Nga Muturi”. Aparecem também jornais africanos, onde jornalistas angolanos denunciam a política de opressão de que Angola é vítima. Lutam por escolas, pela dignidade e pelo respeito pela educação, liberdade de associação e pela fundação de centros de cultura africanos, destacando-se, entre outros, os escritores Cordeiro da Matta e Pedro Félix Machado. Aquele defende a necessidade de Angola ter uma literatura própria.

Reportando-nos novamente a Henrique Guerra “à medida que a sociedade colonial se estrutura, portanto, aquela “pequena burguesia” vai definhando, ao mesmo tempo que se aniquilam as estruturas e as culturas nacionais angolanas”.

“Curioso também é reparar que à medida que os seus jornais vão sendo fechados pela repressão colonial, o movimento intelectual africano se vai organizando em associações culturais, adaptando-se às circunstâncias, para depois ressurgir na época dos anos 30-40”.

Entre 1900 e pouco depois de 1910 aparece-nos a geração de “Luz e Crença” e de “Uma voz de Angola clamando no deserto”. Este último é uma obra colectiva, publicada sob anonimato, “por razões que a repressão então justificava”, datada de 1901. É a intervenção de onze intelectuais angolanos contra um artigo publicado no então único jornal existente, a “Gazeta de Loanda”. Um artigo intitulado “contra a Lei, pela Grey” em que se defendia a subalternidade do homem negro em relação ao branco, negando ao negro o direito de fazer parte da humanidade. Este livro contém já os antecedentes nacionalistas que iriam levar à luta armada pela independência.

Desde então e até 1940 assistimos a um período de “ quase não-literatura”, no entender de Henrique Guerra. Aparece-nos António de Assis júnior, o grande representante desta época, que nos deixou “O segredo da morta” (romance de costumes angolenses) e “O relato dos Acontecimentos de Dala Tando”. Sobre Assis Júnior diz Manuel Ferreira “muito longe do apuramento literário de Alfredo Trony ou Pedro Félix Machado, cuida pelo menos de abandonar a visão colonialista, furtando-se à influência poderosa do romance colonial da época, e procede à construção de personagens e ambientes movimentados nas estruturas sociais e económicas de Angola”. Assis júnior nasceu em 1877 e morreu em Lisboa (no exílio) em 1960.

Na década de 40 do século XX a literatura angolana ressurge, através de jornais como “O Farolim” e o escritor Castro Soromenho.


Colaboração de:

ALEXANDRE CAMPOS

http://www.uea-angola.org/

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