13 de março de 2011

Estávamos sentados à beira mar…





Esperávamos que o sol, ainda longínquo, se alteasse no enrolar de uma onda calma que vinha bem do fundo do céu branco reflectido.
 Estava tudo calmo, falávamos baixinho, desenhávamos na areia fina e fria, não sorriamos, para não demonstrar o nosso lado humano. Simplesmente existiam olhares crus, mas que sentiam emoções suaves, calmas e até consoladoras. Apreciávamos os primeiros raios de sol que finalmente quiseram aparecer e deixar o seu berço.
Com a manhã a chegar, o paraíso rapidamente se tornou num lugar submerso de conversas paralelas, altas, algumas animadas, outras monótonas, também se ouviam os choramingares de criancinhas que sentiam, pela primeira vez, a areia e o sabor da água salgada. Outras, gritavam de alegria, outras corriam, outras nadavam, outras brincavam…, desenhavam na areia, ficando os seus desenhos ou simples esboços do que sentiam (verdadeiras obras de arte), vincados na areia. O mar, como se fosse um apagador mágico, fazia com que elas rapidamente sumissem. Na verdade, quando eu era criança, pensava que o mar roubava os desenhos que eu fazia, para os guardar num tesouro no fundo de si e para, mais tarde, os dar a conhecer aos outros mares distantes dizendo que, por onde andava, tinha tudo o que queria a seus pés.
Rodeados de sentimentos que considerávamos irritantes, começámos a ficar sem paciência. Digo isto, como se tivéssemos feito para não a esgotar! O que é certo, é que na realidade, não chegámos a esperar que ela chegasse ao limite.
Como não queríamos estar a viver no meio daquelas emoções demasiado banais, pegámos nas toalhas e fomos para o outro lado. Refiro-me ao “outro lado”, pois a praia era dividida por um enorme rochedo. Só se podia passar de um lado a outro, quando a maré estava baixa, caso contrário, era como se fossem duas praias, dois lugares distintos, dois mundos…
Este lado, onde agora estávamos, era totalmente o contrário do outro. A areia era azul, a água laranja…
Aqui reinava o silêncio. Era para este local da praia que algumas pessoas como nós, que não queriam sentir, ouvir, nem ver o lado agitado e alegre da vida, mas sim preferiam estar no sossego extremamente extremo, vinham.
Sem barulho, sem sorrisos, sem as emoções quentes, sem os olhares doces… era isto que enchia o vazio espaço deste lado da praia, que por mais pessoas que tivesse estava sempre desguarnecido. Faltava-lhe o lado humano do outro lado.
Nós preferíamos assim…
Estávamos sentados à beira mar. Esperávamos que o sol, agora próximo, se espraiasse no enrolar de uma onda calma que vinha bem do fundo do céu laranja reflectido.
A maré começara a subir, mas como não pretendíamos, por enquanto, voltar ao mundo dos sentimentos, não ligámos e acabámos mesmo por adormecer sob uma toalha negra de silêncio…
Num sono demasiado perdido na tranquilidade assustadora, ouvíamos o mar… simplesmente o… o mar que deste lado calmo da praia, subia; destruía as construções na areia que não existiam, mas que ele queria desmoronar; enchia os nossos corpos de sal…, sal muito mais salgado que o sal doce do lado doce do outro lado da praia.
Permanecemos horas assim, imóveis… no mundo do silêncio emotivo.
Entre pensamentos que sonhavam, subitamente, começámos a ouvir o grito de gaivotas que pareciam perdidas no céu vermelho, o chorar de uns quantos golfinhos que pareciam sem rumo, completamente à “toa”, na tona da água laranja, o falar aterrador da areia azul (pessoas), que nunca tinha falado, o bradar, o chorar, o exclamar, o dizer… Numa confusão exorbitante inimaginável, sonhávamos, acordávamos. Só nos vimos sós, mas numa imensidão de descontrolo total. Toda a gente que anteriormente era simplesmente silêncio, agora, a angústia era tamanha que fazia com que o tal silêncio se transformara em revolta constringente, no pavor de toda a gente.
Não percebíamos o porquê disto tudo. Desta agitação, desta situação!
Até que… demos um passo… dois passos… três… e não queríamos acreditar no que sentíamos. Melhor, no que não sentíamos! Não achávamos a areia nos nossos pés, nem as pedras, nem as conchas, nada… nem o mar… nem o mar sentíamos, a gelar o nosso corpo queimado do sol e do sal ácido. Não percebíamos o porquê disto tudo. Demos o quarto passo e o mar subiu mais… e deixámos de sentir o cheiro a mar e o sabor a sal. Demos o quinto passo e o barulho do pavor de toda a gente aterrorizada sumiu-se, desfez-se, perdeu-se…
Simplesmente deixámos de sentir, de cheirar, de saborear, de ouvir…
Sexto passo!... Seguido de muitos outros, apressados, trémulos, tão pesados que eram leves (não posso afirmar se os passos eram leves ou pesados, porque não sentíamos). Corremos, corríamos por aquele deserto. Simplesmente víamos. Víamos corpos como os nossos, sem sentido, sem sentidos. Outros perdiam os sentidos e eram arrastados pelo mar que subia e subia. Já não nos dava hipóteses de voltarmos para o outro lado da praia, para pedirmos socorro. (Também, como é que íamos pedir ajuda, se provavelmente não tínhamos voz?!)
O mar tornava-se cada vez mais negro, cada vez mais humano, humano silencioso. Não percebíamos o porquê disto tudo.
Até que… como toda a gente estava com o olhar fixamente fixo no mar, este apoderou-se de mais um sentido, a visão.
Nós, felizmente ou infelizmente, (não sabemos ainda bem), estávamos com o olhar fixo no céu e, como este se tinha tornado num espelho, vimos tudo, sem olhar directamente para o mar. Vimos e percebemos o porquê disto tudo. Aquela agitação, aquela situação!
Sem saber o que fazer, víamos o mar a apoderar-se das suas vítimas, tirando-lhes os sentidos. Os sentidos, os sentimentos! Os sentimentos que não quiseram sentir, os sentimentos pelos quais não quiseram passar no lado doce da praia. Não quiseram e não quisemos… Agora já é tarde de mais para voltar ao verdadeiro lado bom da praia, da vida… Queríamos tanto sentir, sentirmo-nos, saborear a alegria, ouvir um sorriso por mais silencioso que fosse… Queríamos ouvir-nos a divertir, a falar, a gritar… como no outro lado, o qual rejeitamos.
 Enfim… chegámos à conclusão que perdemos o verdadeiro valor da vida, ou seja, o lado agitado e alegre da vida, o lado doce. 
Simplesmente deixámos de sentir, de cheirar, de saborear, de ouvir, mas nós, talvez por sermos os humanos mais novos deste lugar mais silencioso que nunca, não deixámos que o mar ficasse com a nossa visão. Assim, conseguimos ver que, por mais que não nos apeteça ouvir o riso da vida, das vidas, é muito importante não o rejeitarmos e vivermos com ele, sempre com ele, pois quando o quisermos sentir, ouvir, ver… já pode ser tarde de mais, ou seja, já estarmos tão mergulhados no silêncio, que este acaba por se apoderar de nós, tal como o mar deste lado que agora consideramos horrível, o lado demasiado silencioso desta praia, desta vida, o fez!...
Há que viver sorrindo e aproveitando ao máximo tudo o que o mar acabou por nos devolver…
Num soluçar súbito, acordámos e corremos para o meio dos sentimentos que já não considerávamos irritantes e, como não queríamos estar a viver no meio do silêncio, demos as mãos àquelas emoções que dizíamos que eram demasiado banais. Depois deste pesadelo, sentimo-las como se fossem especiais e únicas.
E sorrimos para demonstrar o nosso lado humano…

     

                                                                                         Helena Elias, nº15, 10ºC


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